“A esperança é a última a morrer.” Diz-se. Mas não é verdade. A esperança não morre por si mesma. A esperança é morta. Não é um assassínio espectacular, não sai nos jornais. É um processo lento e silencioso que faz esmorecer os corações, envelhecer os olhos dos meninos e nos ensina a perder crença no futuro. O episódio da estação hidrométrica passou a ser um dos alimentos do meu sentimento de esperança. Como se me lembrasse que devo dialogar com invisíveis rios e tudo em meu redor podem ser paredes onde eu nego a tentação do desalento. Tal como o anterior Pensatempos, este não é um livro de ficção. Os textos que aqui se reúnem cumprem a missão de intervenção social que a mim mesmo me incumbo como cidadão e como escritor. Com a excepção do artigo sobre a eleição de Obama, todos os restantes textos foram concebidos para alocuções a serem proferidas em encontros e colóquios dentro e fora de Moçambique. Conservei o mais possível a forma coloquial e deixei intencionalmente escapar, aqui e ali, pequenas repetições e improvisações. Alguns destes textos foram concebidos para o contexto de Moçambique e, eventualmente, pecarão por essa especificidade para o leitor não moçambicano. Acredito, porém, que os rios que percorrem o imaginário do meu país cruzam territórios universais e desembocam na alma do mundo. E nas margens de todos esses rios há gente teimosamente inscrevendo na pedra os minúsculos sinais da esperança. 7/187 Mia Couto