Neste capítulo, pretende-se abordar de forma sintética as alterações morfológicas e funcionais apresentadas pelas células dos tumores malignos. Para tanto, com o propósito de facilitar a compreensão dessas alterações, assinalam-se alguns postulados referentes ao comportamento biológico das células normais. As células normais de todo organismo vivo coexistem em perfeita harmonia citológica, histológica e funcional, harmonia esta orientada no sentido da manutenção da vida. De acordo com suas características morfológicas e funcionais, determinadas pelos seus próprios códigos genéticos, e com sua especificidade, as células estão agrupadas em tecidos, os quais formam os órgãos. Os mecanismos que regulam o contato e a permanência de uma célula ao lado de outra, bem como os de controle do seu crescimento, ainda constituem uma das áreas menos conhecidas da biologia. Sabe-se que o contato e a permanência de uma célula junto à outra são controlados por substâncias intracitoplasmáticas, mas ainda é pouco compreendido o mecanismo que mantém as células normais agregadas em tecidos. Ao que parece, elas se reconhecem umas às outras por processos de superfície, os quais ditam que células semelhantes permaneçam juntas e que determinadas células interajam para executarem determinada função orgânica. Sabe-se também que o crescimento celular responde às necessidades específicas do corpo e é um processo cuidadosamente regulado. Esse crescimento envolve o aumento da massa celular, duplicação do ácido desoxirribonucléico (ADN) e divisão física da célula em duas células filhas idênticas (mitose). Tais eventos se processam por meio de fases conhecidas como G1 - S - G2 - M, que integram o ciclo celular. Nas células normais, restrições à mitose são impostas por estímulos reguladores que agem sobre a superfície celular, os quais podem resultar tanto do contato com as demais células como da redução na produção ou disponibilidade de certos fatores de crescimento. Fatores celulares específicos parecem ser essenciais para o crescimento celular, mas poucos deles são realmente conhecidos. É certo que fatores de crescimento e hormônios, de alguma forma, estimulam as células para se dividir. Entretanto, eles não têm valor nutriente para as células nem desempenham um papel conhecido no metabolismo. Presumivelmente, apenas sua capacidade de ligar-se a receptores específicos de superfície celular os capacita a controlar os processos celulares. O mecanismo de controle do crescimento celular parece estar na dependência de fatores estimulantes e inibidores, e, normalmente, ele estaria em equilíbrio até o surgimento de um estímulo de crescimento efetivo, sem ativação do mecanismo inibidor. Tal estímulo ocorre quando há exigências especiais como, por exemplo, para reparo de uma alteração tissular. As células sobreviventes se multiplicam até que o tecido se recomponha e, a partir daí, quando ficam em íntimo contato umas com as outras, o processo é paralisado (inibição por contato). Em algumas ocasiões, entretanto, ocorre uma ruptura dos mecanismos reguladores da multiplicação celular e, sem que seja necessário ao tecido, uma célula começa a crescer e dividir-se desordenadamente. Pode resultar daí um clone de células descendentes, herdeiras dessa propensão ao crescimento e divisão anômalos, insensíveis aos mecanismos reguladores normais, que resulta na formação do que se chama tumor ou neoplasia, que pode ser benigna ou maligna. A carcinogênese refere-se ao desenvolvimento de tumores malignos, estudada com base nos fatores e mecanismos a ela relacionados.