Ao aceitar o convite para escrever este prefácio, várias cenas foram desenhando-se à minha frente, capturadas de um tempo especial de atividade profissional. Pareceramme pouco os mais de trinta anos de atuação na área clínica da Toxicologia, atendendo aos chamados telefônicos, percorrendo corredores de hospitais, lutando contra os tempos alheios – dos doentes graves no setor de emergência ou na unidade de terapia intensiva (UTI) e dos profissionais orientados à distância. Recordei-me de crianças em súbita apneia, que choravam logo após serem admitidas à UTI (intoxicação por nafazolina), de jovens vencendo estados de coma e negando a participação em festas perigosas (drogas ilícitas), além de idosos confusos solicitando seus remédios habituais antes mesmo da alta hospitalar (interação medicamentosa). Sentime novamente constrangida ao lembrar-me de pacientes e familiares em difíceis retornos ao hospital para o necessário seguimento clínico-toxicológico, psicológico, psiquiátrico ou social (intoxicações por praguicidas, tentativas de suicídio, maus tratos), quando só era possível recebê-los em salas desconfortáveis, improvisadas no Centro de Controle de Intoxicações de São Paulo (CCI). Revivi momentos agradáveis em que me atrevia a ensinar quando precisava aprender, com alunos e profissionais que tinham a oportunidade de visitar o CCI ou quando recebia convites para ministrar aulas em universidades. Lá estavam graduandos de diversas áreas, médicos-residentes ou já especialistas e até mestres ou doutores esperando por ”um especialista em intoxicações”. Muito foi construído em diálogos abertos nessas ocasiões, assim como em outros mais discretos, que ocorriam à beira dos leitos dos doentes, sem formalidades porque para isso não havia tempo.